– Vou represar o curso de água e usá-lo para mover o elevador. Como já referi, quero mudar os moinhos de vento para poderem abastecer a cidade com água. Por fim, quero alargar o experimento com os condensadores, para tentar iluminar uma parte da cidade.

– E que dificuldades técnicas espera encontrar?

– Os fios condutores não são puros o suficiente, causando aquecimento e perdas consideráveis. Espero que a metalurgia consiga providenciar melhores materiais. Os condensadores não possuem uma grande capacidade, contudo espero conseguir melhorá-la substancialmente nas próximas semanas…

Hesitou, pois havia outro problema, um pouco mais grave. A energia eléctrica gerada pelos metais irradiados e pelos geradores era diferente. Só a primeira podia ser guardada e não podia ser usada para mover motores. Não sabia qual a diferença entre as duas e, como tal, não fazia ideia de como ultrapassar este obstáculo. Algo lhe dizia que Artur não iria aceitar bem tal limitação e sabia que na era nuclear aquele problema havia sido resolvido, de modo que optou pela via do silêncio.

– Creio que esses problemas podem ser resolvidos com tempo. Estamos muito satisfeitos com o teu desempenho, o consumo de carvão tem diminuído gradualmente. Esperamos que, ao estenderes as invenções para outros sistemas, nos poderemos libertar desta dependência. Se ninguém tem mais nada a dizer, eu darei esta reunião por terminada – concluiu o líder do castro.

Ninguém ousou contrariá-lo. Assim que os assessores começaram a dispersar, Artur veio ao seu encontro. A expressão amistosa tinha desaparecido de todo.

– Preciso de falar contigo, em privado. Espera por mim no corredor – pediu, enquanto cumprimentava o inventor.

O sangue gelou-se-lhe nas veias ao apertar a mão do governante.

– Sim, claro… – balbuciou em pânico, sabendo que Artur leria facilmente as suas expressões.

Abandonou a sala, completamente alheado da realidade e tomado pelo medo. Houve um momento de hesitação em que pensou em fugir. Todavia, em plena luz do dia, isso seria suicídio. Deu voltas e mais voltas, percorrendo o corredor de ponta a ponta. A sua cabeça dava ainda mais voltas, pois não sabia o que fazer.

Quando o pai de Eva apareceu, já Walter estava no mais profundo dos abismos psicológicos.

– Desculpa ter-te feito esperar. Vou ser directo e sincero contigo, eu sei que me estás a esconder algo. Tens duas hipóteses: dizes-me o que é, ou eu descubro e tu sofrerás as consequências. O que preferes?

Quis falar, mas as palavras não lhe obedeciam. Gostava de pelo menos saber a que é que ele se referia. Se lhe falasse sobre Eva, talvez pudesse escapar vivo, pois ainda precisavam dele. Ao revelar sobre os problemas técnicos, poderia ter algum tipo de complacência, já que o obstáculo poderia ainda ser ultrapassado. Recordou-se que Eva prometera-lhe uma fuga, de modo que o mais sensato seria falar do problema técnico e esperar que a fuga se consumasse com sucesso.

Ao explicar as limitações entre os dois tipos de corrente eléctrica, viu que a expressão de Artur se ia suavizando.

– Ainda bem que me contaste. Não precisas de te preocupar, os teus esforços estão a dar-nos tempo. E tempo poderá dar-nos mais soluções. Tenta resolver o problema e, mesmo que não consigas, havemos sempre de conseguir diminuir o consumo de carvão – Artur fez uma pausa, olhando-o nos olhos. – Há uma coisa que te quero contar. A mina tem mais carvão do que te dissemos. O grande problema é a presença de metais pesados, que tememos serem radioactivos. A cada ano que passa, a concentração tem aumentado, o que está a provocar doenças nos trabalhadores e até mesmo nas pessoas da cidade. É certo que a queima de carvão provoca doenças respiratórias, contudo o ritmo a que têm aumentado nos últimos cinco anos deixou-nos alarmados. Não são dezenas nem centenas, isto pode afectar uma em cada cinco pessoas em menos de vinte anos. Percebes agora a urgência do projecto?

Walter acenou com a cabeça, sabendo que a sua fuga seria ainda mais difícil do que antecipara.

– E claro, a capacidade da mina é finita. Não haverá carvão, mesmo contando com o que está contaminado, para mais de quinze anos. Peço desculpa por não te ter dito antes, mas o conselho não havia autorizado – explicou o líder do castro.

– Vou dar o meu melhor – prometeu Walter, esperando que o tom soasse convincente.

– Eu acredito que sim. Já agora, estás a esconder-me mais alguma coisa? – inquiriu de surpresa.

– Não! – respondeu bruscamente.

– Ainda bem – aceitou Artur, retirando-se de seguida.

O inventor não sabia se as palavras dele haviam sido sinceras. A negação fora demasiado brusca para passar despercebida. Era irrelevante, concluiu, pois ganhara tempo, que era o que mais precisava naquele momento. Achou melhor voltar aos seus aposentos.

Ao entrar, viu que Eva o esperava. Pareceu-lhe estar muito mais alegre que naquela manhã. Ela veio ao seu encontro e deu-lhe um abraço reconfortante, acompanhado de um beijo carinhoso.

– É perigoso vires aqui – protestou o inventor assim que se separaram.

– Já não faz diferença. Está tudo arranjado, deves descansar. Iremos partir ao fim da tarde.

– Qual é o plano?

– Confias em mim ou não? – devolveu ela, com um sorriso.

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